O veneno de uma
vespa brasileira, Polybia paulista, contém uma poderosa toxina que mata células
de câncer, sem danificar células saudáveis. Agora, um grupo de cientistas da
Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade de Leeds, na
Inglaterra, descobriu exatamente como a toxina, chamada MP1, consegue abrir
buracos exclusivamente nas células cancerosas, destruindo-as.
O estudo,
publicado nesta terça-feira, 1, na revista científica Biophysical Journal,
poderá inspirar a criação de uma classe inédita de drogas contra o câncer,
segundo os cientistas. De acordo com um dos autores do estudo, Paul Beales, da
universidade inglesa, a toxina MP1 não afeta as células normais, mas interage
com lipídios - moléculas de gordura - que estão distribuídos de forma anômala
apenas na superfície das células de câncer. Ao entrar em contato com a membrana
dessas células, a toxina abre buracos por onde escapam moléculas essenciais
para seu funcionamento.
"Terapias
contra o câncer que atacam a composição de lipídios da membrana da célula
seriam uma classe inteiramente nova de drogas antitumorais. Isso poderia ser
útil para o desenvolvimento de novas terapias combinadas, nas quais múltiplas
drogas são utilizadas para tratar um câncer atacando diferentes partes de suas
células simultaneamente", disse Beales.
De acordo com
outro dos autores, João Ruggiero Neto, do Departamento de Física da Unesp em
São José do Rio Preto, a Polybia paulista foi descoberta e descrita pelo
professor Mário Palma, da Unesp de Rio Claro. Os cientistas já haviam
estudado a toxina MP1 e sabiam que ela agia contra micróbios causadores de
doenças destruindo a membrana das células bacterianas. Mais tarde, os estudos
revelaram que a toxina é promissora para proteger humanos de câncer e tem
capacidade para inibir o crescimento de células de tumores de próstata e de
bexiga, além de células de leucemias resistentes a várias drogas.
Até agora, no
entanto, não se sabia como a MP1 é capaz de destruir seletivamente as células
tumorais, sem danificar as células saudáveis. "Desde que descrevemos
a toxina do veneno dessa vespa, em 2009, sabíamos que ela contém peptídeos com
uma forte propriedade antibacteriana, funcionando como um antibiótico potente.
Mais tarde,
pesquisadores coreanos e chineses começaram a fazer trabalhos com esses
peptídeos sobre células de câncer e nós fomos estudar sua ação em linfócitos
com leucemia", disse Neto ao jornal Estado de S. Paulo.
Mecanismo
O grupo da Unesp
confirmou então que as toxinas eram extremamente seletivas, reconhecendo apenas
os linfócitos leucêmicos, e não os sadios. Eles começaram suspeitar que a
explicação para essa seletividade tinha relação com as propriedades únicas das
membranas de células de câncer. "Fomos investigar o mecanismo",
afirmou Neto. Segundo ele, em membranas de células saudáveis, os
fosfolipídios chamados PS e PE se situam na membrana interna, voltados para o
lado de dentro da célula. Mas, nas células de câncer, os PS e PE ficam
incorporados na membrana externa, voltados para o ambiente em volta da
célula. Os cientistas testaram sua teoria criando membranas-modelo
contendo PE e PS e as expondo à MP1. Eles utilizaram uma ampla gama de técnicas
biofísicas e de imageamento para caracterizar os efeitos destrutivos da MP1
sobre as membranas.
O resultado foi
impactante: a presença de PS aumentava de 7 a 8 vezes a quantidade de MP1 que
se ligava à membrana. A presença de PE, por outro lado, aumentava a capacidade
da MP1 de danificar rapidamente a membrana, aumentando o tamanho dos buracos de
20 a 30 vezes. "Formados em poucos segundos, esses poros são grande o
suficiente para permitir o vazamento de moléculas críticas para a célula, como
RNA e proteínas. O aprimoramento dramático da permeabilização induzida pela
toxina na presença do PE e as dimensões dos poros nessas membranas foram
surpreendentes", disse Neto.
Potencial
Em estudos
futuros, os cientistas planejam alterar a sequência de aminoácidos da MP1 para
examinar como a estrutura da toxina se relaciona à sua função, a fim de
aprimorar sua seletividade e sua potência para propósitos
clínicos. Segundo Beale, entender o mecanismo de ação dessa toxina vai
ajudar estudos translacioais - isso é, pesquisa científica aplicada
clinicamente - para avaliar no futuro o seu potencial para o uso na
medicina. "Como ficou demonstrado em laboratório que a toxina é
seletiva para células de câncer e não é tóxica para células normais, ela tem
potencial para ser segura.
Fonte: Mega
Curioso
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